Uma data para reflexão em memória das vítimas de acidentes e doenças decorrentes do trabalho
“O desbarato mais absurdo não é o dos bens de
consumo, mas o da humanidade: milhões e milhões de seres
humanos nasceram para serem trucidados pela História,
milhões e milhões de pessoas que não possuíam mais do
que as suas simples vidas. De pouco ela lhes iria servir, mas
nunca faltou quem de tais miudezas se tivesse sabido
aproveitar. A fraqueza alimenta a força, para que a força
esmague a fraqueza.”
José Saramago*
Dia 28 de abril de 1969: setenta e oito mineiros, após uma explosão numa mina existente em Virginia, nos Estados Unidos, morrem. Em 2003, a OIT instituiu essa data, como o Dia Mundial da Segurança e da Saúde no Trabalho. No Brasil, com o mesmo intuito, foi criada a Lei 11.121/05, considerando a data como como o Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho.
No mundo inteiro, eventos são realizados para que essas vítimas não sejam esquecidas e possamos repensar sobre o que temos feito e podemos fazer enquanto profissionais, dando continuidade às ações capazes de provocar mudanças positivas no cenário do mundo laboral, para que não se não se repitam os fatos, já que é impossível a recuperação dessas vítimas.
2021: A analisando o presente, vemos que falta muito a fazer. Apesar de algumas legislações severas, diversos tipos de atuações, permitem que, ano a ano, não se avance tanto quanto seria necessário para a redução de agravos à saúde dos trabalhadores. Revisões de normas prometem melhorias, mas a palavra “promete”, nos remete a um sentido vago, pois não há garantia. Promessa não é certeza. Continuam ocorrendo acidentes e mortes por motivos injustificáveis.
Cinquenta e dois anos após o fatal acidente em Virginia, há, ainda, vítimas decorrentes dos mesmos motivos que lhes roubam a saúde ou a vida: descaso.
Operários caem de lajes por falta de cintos de segurança. Inúmeros outros, são vítimas de acidentes e mortes, igualmente inaceitáveis. E morrem ou ficam sequelados, fazendo parte da legião dos desafortunados no mundo do trabalho. Com a pandemia, evento adverso, impactante e nefasto, isto se acentuou. O aumento diário, incontrolável, de agravos à saúde física e mental de trabalhadores, pela precarização do trabalho, pelo desemprego, além de todas as outras consequências da Covid- 19, é alarmante. Vivemos momentos nunca imaginados. Na análise de quaisquer dos casos dessas vítimas, verificase, na maioria das vezes, a falta de uma cultura de segurança com adoção dos princípios de comportamento seguro. Medidas de precaução padrão, não adotadas, resultam em acréscimos de vitimados. Sofremos por sabermos que poderiam e podem ser evitadas. E se não são, devem-se à absurda existência de locais inadequados, em face da imperdoável negligência dos que não cumprem os requisitos mínimos que evitariam isso. E alguns desses culpados, sabedores que são dos seus atos, às vezes conseguem sepultar seus sentimentos, tal como são sepultadas as vítimas dos acidentes que causaram mortes. Insepultos, ficam os sentimentos de dor de quem perdeu seus entes queridos.
A tanatofobia, nunca foi tão presente nas conversas diárias. A insegurança, a desmotivação e as dores pelas perdas de entes queridos, estão gerando transtornos psíquicos, tentativas de suicídio, uns, concretizados, e outros adoecimentos. Tudo isso, forma um mapa, lamentável, de uma sociedade adoecida e que adoece. Ninguém, em sã consciência, pode compactuar com tamanho descaso. Todas as mortes e adoecimentos nos afetam. Por negligência? Mais ainda.
Se pelos que adoeceram ou morreram, infelizmente, nada mais se pode fazer, que façamos o possível para evitar novas ocorrências. Nada apagará a memória e a dor, pelo ocorrido. Mas, nosso empenho por melhores condições de trabalho e de vida, podem amenizar dores futuras.
Assim, que nesta data, possamos refletir, onde quer que estejamos, sobre as pessoas que já não estão entre nós e, nas outras, inúmeras, ainda sadias, ou já adoecidas, que não sabem como será seu futuro. Que nada seja capaz de nos tornar insensíveis diante das dores provocadas por acontecimentos que possam resultar em novos adoecimentos e mortes.
Muitas dependem do nosso saber e da nossa capacidade de atuação para que o melhor lhes aconteça. Estamos incluídos nisto, enquanto sujeitos ao mesmo destino, de morte prematura, diante de um cenário cruel. Nossos atos, independentes ou conjuntos, podem sensibilizar os responsáveis por essas ocorrências, mudando o panorama atual. Finalizo com perguntas necessárias para reflexões: se temos um importante papel neste cenário, quanto foi feito dentro do que foi planejado para que todos tenham melhores dias? O que, ainda, precisamos fazer? Respondidas as perguntas, resta-nos agir.
Dra Edenilza Campos de Assis e Mendes – Conselho Científico APMT
Dr Mário Bonciani – Diretoria Financeira APMT
Dra Flávia Almeida – Presidente APMT