Sigilo Médico

MATÉRIA SOBRE SIGILO MÉDICO

Versão: 05/03/2020

 

Decisão judicial fortalece a Recomendação 01/16 da APMT

 

Histórico da Recomendação

Com o objetivo de oferecer orientação aos Médicos do Trabalho em relação aos preceitos éticos na realização da contestação administrativa de casos de afastamento previdenciário, a Diretoria da Associação Paulista de Medicina do Trabalho (APMT) aprovou em 05/12/2016 a Recomendação Ética (RE) nº 01/16, que tratava da “Contestação ao Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP

A referida Recomendação foi elaborada a partir da reunião Científica promovida pela APMT em 22/08/2016, com a participação de representantes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP), de profissionais Médicos do Trabalho e Docente da área de Ética Médica. Foi então elaborada uma proposta base submetida à consulta pública de 07/10/2016 à 07/11/2016.

A Recomendação tinha como sustentação jurídica: Decreto nº 3.048/99, Lei nº 8.213/91 da Previdência Social, Instrução Normativa nº 31/2018 do INSS, Resolução nº 1931/2008 e o Parecer n° 13/2016 do CFM, além de outros dispositivos legais constitucionais e infraconstitucionais que tratam do assunto.

A RE n° 01/2016, baseada no arcabouço legal resumida acima, concluía:

“… que o Médico do Trabalho não pode, sem o consentimento do paciente, revelar o conteúdo do prontuário ou ficha médica, mesmo que as informações sejam destinadas, exclusivamente, ao Médico Perito da Previdência Social.”

“… recomendamos que, na elaboração das contestações administrativas, sejam utilizadas somente informações que permitam ao perito do INSS analisar as condições e os ambientes de trabalho, de modo a contribuir para descaracterização do nexo, se não houver a exposição ocupacional.

Posicionamento do CFM

Em 26/01/2017, o CFM de forma unilateral, sem consulta a sociedade ou as representações da especialidade modifica o Parecer 13/2016 e publica o Parecer 03/2017 que conclui:

 “ … baseado em motivo justo, se o médico do trabalho detém os elementos para contestar o nexo estabelecido epidemiologicamente entre doença e trabalho pela perícia médica do INSS, deverá fazê-lo com critérios científicos e dados do prontuário … “

A referida alteração do Parecer gerou posicionamento contrário da ANAMT, das representações de todas as centrais sindicais brasileiras e de outras entidades da área:

“O Fórum Nacional das Centrais Sindicais em Saúde do Trabalhador, juntamente com os movimentos sociais, ONGs e órgãos e associações convidadas e atuantes na defesa da segurança e saúde do trabalhador e trabalhadora, em reunião nesta data, vêm, publicamente, manifestar sua indignação com a decisão do Conselho Federal de Medicina (CFM), que editou o Parecer 3/17 (publicado em 13 de fevereiro de 2017), alterando o Parecer 13/2016, e repudiar a iniciativa do CFM pelas razões expostas …”

A APMT, apesar de discordar do posicionamento do CFM, cancelou a Recomendação e a retirou do site.

Em resposta às manifestações e o posicionamento do MPT, o CFM, em 21/09/2018, publicou a Resolução n° 2.183, que no seu artigo 9º, reforçou o entendimento do Parecer contestado:

Art. 9º Na contestação de nexo estabelecido pela perícia médica previdenciária, se o médico do trabalho detém elementos de convicção de que não há relação entre o trabalho e o diagnóstico da doença, deverá fazê-lo com critérios técnicos e científicos.

  • 1º Em sua peça de contestação de nexo ao perito médico da Previdência, o médico do trabalho poderá enviar documentação probatória demonstrando que os agravos não possuem nexo com o trabalho exercido pelo trabalhador, tais como:

VIII – relatórios e documentos médico-ocupacionais, inclusive dados do prontuário que poderá ser usado nos casos em que a contestação depender daquelas informações e enviá-las em caráter confidencial ao perito previdenciário.

Posicionamento da Justiça

Em 23/07/2019, a 4ª Vara da Justiça do Trabalho de Brasília decide o deferimento de tutela antecipada em favor da inicial do MPT suspendendo “…  os efeitos do .. art. 9º,  e § 1º,  e inciso VIII, da Resolução nº 2.183/2018 do CFM… sob pena de multa diária … “. Um mês depois, em 06/08/2019, o CFM suspende a parte da Resolução ajuizada.

No final do mês passado, em 28/02/2020, em decisão definitiva nos processos iniciados a partir de duas ações civis públicas ajuizadas pelo MPT contra o CFM, a 4ª Vara declarou nulo o Parecer 03/2017 e o art. 9º, parágrafo 1° e inciso VIII da Resolução CFM n° 2.183/18 por entender que os dispositivos autorizam os médicos do trabalho violar o sigilo de informações íntimas dos trabalhadores. A sentença também proíbe que o Conselho edite novos atos que autorizem o desrespeito à intimidade das informações de saúde dos trabalhadores presentes nos prontuários produzidos pelos SESMT.

Uma vitória para todos os envolvidos na saúde dos trabalhadores, nesse momento conturbado.

 

Mario Bonciani

05/03/2020

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