A Gripe Espanhola

A gripe espanhola – uma pandemia que “varreu” o mundo

As pandemias sempre existiram na humanidade, mas seu registro e identificação do agente causador nem sempre foi possível. O século XIX teve 3 grandes pandemias sendo a última – no final do século, estudada por Phiffer, aluno e depois colaborador de Koch, que identificou um patógeno chamado de Haemophilus influenzae mesmo sem a verdadeira identificação do que hoje chamamos de vírus. Isto ocorreu na última década daquele século, em 1892.

Há 100 anos, de 1918 a 1920, o mundo inteiro conheceu a maior pandemia do século XX que, possivelmente iniciou-se nos Estados Unidos, entre soldados numa base militar, no Kansas, embora sua origem possa ter sido em outros locais com aglomeração de pessoas (evento nos EUA em set 1918 com 200 mil pessoas), condições de higiene precárias, bem como o estado nutricional da população na própria Europa e nas trincheiras, em plena Primeira Guerra Mundial. Ficou conhecida por Gripe Espanhola, pois os países em guerra não quiseram anunciá-la, muito embora soubessem da sua existência, mas foi a Espanha, que não participava da guerra que a divulgou, pela imprensa livre da época, e assim ficou conhecida. Estudiosos estimam que tenha matado de 20 a 100 milhões, afetou 500 milhões de pessoas, cerca de 25% da população mundial, na época.

Hospital militar de emergência montado no Kansas (EUA) para tratar as vítimas locais da pandemia de gripe espanhola.

Fonte: https://incrivelhistoria.com.br/gripe-espanhola/

O Brasil foi assolado por uma gripe pneumônica, causada pelo vírus influenza H1N1, nossa mais mortal pandemia – a mesma gripe espanhola. A história diz que o primeiro surto foi em março de 1918, mas foi a bordo do navio Demerara  vindo da Inglaterra para o Rio de Janeiro, com escalas em Recife e Salvador, que se alastrou rapidamente pelo país, a partir de setembro deste mesmo ano. A época, as distâncias eram maiores e os patógenos eram transportados em navios que levavam tempo significativo para se alastrarem. Ao passo que hoje são rapidamente transportados em aviões que ligam rapidamente o mundo.

A gripe espanhola foi subestimada no princípio. As autoridades sanitárias eram contrárias a quarentenas e isolamentos sociais. Houve censura aos meios de comunicação, acusados de sensacionalismo e de criar alarde desnecessário. Houve conflitos de opiniões entre o governo federal e os estados. A situação se inverteu quando a epidemia se mostrou fora de controle e Carlos Chagas passou a chefiar o combate à epidemia, criando hospitais em emergências e publicando panfletos e cartazes para orientar a população.

Fonte: https://espacodemocratico.org.br/nao-deixe-de-ler/como-a-gripe-espanhola-trouxe-panico-e-morte-ao-brasil/

Fonte: https://www.360meridianos.com/especial/gripe-espanhola-1918

Na cidade de São Paulo foram ao menos 5.331 mortes notificadas em uma população de cerca de 580 mil habitantes e estima-se que 350 mil foram infectados no estado de São Paulo, com inúmeras subnotificações. A partir de 01 de novembro de 1918, a cidade ficou 66 dias em isolamento frente ao número de mortos ocorridos em Salvador e na capital do país na época – Rio de Janeiro. Os mais atingidos pelo vírus da gripe espanhola estavam na faixa dos 25 a 35 anos, tendo impacto sobre a população economicamente ativa. Houve colapso dos serviços públicos, abastecimento, sobretudo entre os profissionais da saúde. Atingiu também os coveiros e, com sua ausência, houve pilhas de cadáveres enterrados em covas comuns e corpos insepultos nas ruas, situação que nos remete a imagens recentes no Equador, assim como o Cemitério da Consolação que ficava iluminado 24 horas por dia podendo ter enterros à noite também.

Caminhão cheio de caixões mortuários indo ao necrotério.

Fonte: https://vejario.abril.com.br/blog/daniel-sampaio/gripe-espanhola-memorias-cariocas-de-uma-tragedia-anunciada/

Diz a lenda, com algum sopro histórico que a caipirinha foi inventada nesta época, pois limão, mel e alho já eram prescritos para quadros gripais e então foi sugerido acrescentar álcool (no caso a nossa cachaça) para auxiliar no tratamento preventivo. Com o tempo, retirou-se o alho e o mel e com uma dose de açúcar estava criada a caipirinha.

Recomendações do Serviço Sanitário de São Paulo para prevenir a gripe espanhola

Fonte: https://influb.wordpress.com/2012/09/27/a-historia-do-influenzavirus/

Vale lembrar também que, na época, não dispúnhamos de antibióticos, anti-retrovirais, UTI’s, aparelhos de respiradores e dos conhecimentos científicos atuais. Por outro lado, medidas de isolamento, comércio fechado assim como as escolas, distanciamento social, higienização das mãos hoje tão divulgadas para a pandemia pelo SARS-Cov2 (Covid-19), são as mesmas já conhecidas e orientadas para a gripe espanhola de H1N1, de 1918. Salienta-se também que houve uma segunda pandemia no século XX de H1N1 e ocorreu mais recentemente, em 2009, mas sem o mesmo impacto que está sendo a atual e em todas as esferas de comprometimento.

Temos que olhar para frente, mas também para o passado e refletir sobre nossos dramas vividos, aprendizados obtidos, a custo de muito sofrimento, tentativas e erros, mas acima de tudo por saber que uma pandemia não é só sobre uma doença biológica, mas tem também sua dimensão cultural, social, política e econômica. Por mais desanimador que possa parecer o momento atual, com laivos de esperança, encontraremos soluções, a pandemia passará e sairemos dela mais fortes, unidos e prontos para uma nova experiência mundial sobre o existir humano no século XXI.

Nestes tempos de isolamento social gostaríamos de sugerir aos nossos associados como suplemento cultural a leitura do livro autobiográfico de Nelson Rodrigues – “Memórias: A Menina Sem Estrela” (1967), em especial os capítulos 11 e 12 em que o autor, jornalista e dramaturgo aborda a gripe espanhola por ele vivenciada no Rio de Janeiro; assim como o livro “Chão de Ferro” de Pedro Nava (1976) que também tem capitulo sobre a gripe espanhola.

 

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Fábio Secolin e Vera Lucia Zaher-Rutherford

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