O aumento na expectativa de vida do brasileiro já tem impactado no mercado de trabalho. O que fazer com essa população de idosos que vem crescendo substancialmente dentro das empresas, resultando mudanças relevantes para o ambiente laboral? Para falar sobre o tema, entrevistamos o Doutor José Domingos Neto.
DOUTOR JOSÉ DOMINGOS, O ENVELHECIMENTO DO MERCADO DE TRABALHO JÁ É UMA REALIDADE?
O envelhecimento do mercado de trabalho é reflexo das modificações etárias que ocorrem na população, com a diminuição da natalidade, e em contrapartida, com o aumento da expectativa de vida. No Brasil, dados do IBGE deixam evidentes essa modificação. Em 2000, a população acima de 60 anos representava 9% da população. Já em 2011, a porcentagem subiu para 12,1%. Conclusivamente, observou-se um aumento de 55% no número de idosos em 10 anos. E a estimativa para 2050 é que a população idosa no Brasil represente 30% da população. Respondendo a sua pergunta: sim, observamos que o envelhecimento do mercado de trabalho já é uma realidade. Os países da América do Sul, incluindo o Brasil, estão em processo semelhante aos países que formam a Europa e a América do Norte, e o mercado de trabalho e os Médicos do Trabalho, precisam se reestruturar para uma nova lógica.
QUAL SERIA O REFLEXO IMEDIATO PARA AS EMPRESAS?
O reflexo imediato para as empresas é a modificação do perfil de adoecimento do trabalhador. Desta forma, espera-se um aumento importante das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), especialmente associadas ao risco cardiovascular. Assim, um cenário já complexo de aumento de custos em saúde tende a se agravar.
JÁ EXISTEM INICIATIVAS QUE ABORDAM ESSA SITUAÇÃO? O SENHOR PODERIA EXEMPLIFICAR?
A interface entre a saúde do trabalhador e a emergência de DCNT é uma preocupação crescente nos países da Europa e nos Estados Unidos. Neste último, a NIOSH – agência governamental americana, publicou uma iniciativa chamada Total Worker Health. Já os países da União Europeia, à partir da declaração de Luxemburgo, publicaram o Workplace Health Promotion. Neste sentido, estudo RAND de 2014 mostrou que mais de 50% das empresas americanas com mais de 50 trabalhadores, já tem estruturado aos seus serviços de saúde os programas de qualidade de vida.
E NO BRASIL, JÁ EXISTE ALGUM TRABALHO SIGNIFICATIVO JUNTO A ESTA POPULAÇÃO?
No Brasil as iniciativas ainda são incipientes. Dentro de alguns acordos coletivos de trabalho e em alguns ramos de atividade, verifica-se a garantia de estabilidade de emprego aos trabalhadores próximos da aposentadoria. Além disso, algumas empresas, principalmente multinacionais instaladas no Brasil, apresentam estruturados em seus serviços de saúde os chamados Programas de qualidade de vida do trabalhador. Contudo, o desafio é generalizar essas iniciativas que focam no cerne do problema para um maior número de empresas.
COMO O MÉDICO DO TRABALHO PODE INCORPORAR A SAÚDE DO TRABALHADOR À PROBLEMÁTICA DAS DCNT? O SENHOR TEM ALGUMA RECOMENDAÇÃO?
O PPRA e o PCMSO desafiam, cotidianamente, o médico do trabalho a lidar com a lógica da prevenção, rastreamento e vigilância de doenças ocupacionais. Dessa forma, uma ação inicial para o médico do trabalho seria incorporar rastreamento de fatores de risco não ocupacionais no exame periódico, a fim estruturar ações de saúde para as DCNT. Para tanto, os colegas podem buscar benchmarking com empresas que já estruturaram essa nova lógica em seus serviços. Ao mesmo tempo, deixo o convite aos colegas para participarem do evento da APMT “O Médico do Trabalho na Gestão de Saúde Populacional, um olhar além da Gestão de Crônicos” a ser realizado na Sede da APM no dia 05/08/2017.
Doutor José Domingos Neto possui título de especialista em Médico do Trabalho pela ANAMT e em Clínica Médica pela UNIFESP. Atua profissionalmente pelo Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC) e pela Caixa de Assistência aos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI).