O controle da vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19)
O dia 08 de dezembro de 2020 marcou o início da vacinação contra o covid-19 no mundo, com a primeira vacina sendo aplicada no Reino Unido. No Brasil, a primeira dose foi dada em 17 de janeiro de 2021 e já temos cerca de 9% da população vacinada com esquema completo. Temos disponível no país três vacinas com plataformas diferentes: Sinovac/Butantan (vírus morto atenuado), AstraZeneca/Oxford (adenovírus vetor) e Pfizer/BionTech (RNA).
Um questionamento que o médico do trabalho deve enfrentar em breve, será sobre qual critério utilizar em relação ao controle da imunidade dos empregados que já foram vacinados.
No entanto, sabemos que a resposta imune após a vacinação não depende apenas da imunidade humoral. O estímulo do sistema imune, pelo vírus ou vacina, gera uma resposta mais ampla com o estímulo da imunidade celular através das células TCD4+ e TCD8+. Elas possuem um papel importante na defesa contra a infecção pelo SARS-CoV-2. Os ensaios sorológicos utilizam antígenos específicos do vírus, aos quais os anticorpos do paciente se ligam e são marcados para posterior mensuração. Os kits diagnósticos utilizam, principalmente, o RDB da proteína S, a subunidade S1 e/ou a proteína N.
Os testes para identificação específica dos anticorpos neutralizantes possuem um grande potencial para avaliação da imunidade contra o covid-19. Porém, possuímos diversas metodologias, não possuímos estudos clínicos com sua utilização para mensuração de níveis de proteção e desconhecemos a influência de diversas cepas na sua resposta. Apesar de podermos utilizar o teste para uma comparação em relação a resposta imune de diversas vacinas. Não podemos concluir que anticorpos mais altos seja indicativo de maior imunidade ou proteção em relação ao vírus. Além do fato que testes negativos não podem ser interpretados como falha na proteção, já que algum grau de imunidade celular pode ter sido desenvolvido. Portanto, apesar do teste de anticorpos neutralizantes apresentar boas perspectivas, ainda seria prematuro a sua utilização no controle da população de vacinados.
O surgimento de novas cepas com rápida adaptação como o P1 (no Brasil), B.1.351 (na África do Sul), B.1.1.7 (no Reino Unido) e B.1.617 (na Índia) aumenta a preocupação global em relação a eficácia das diversas vacinas. Apesar do desenvolvimento da imunidade após a infecção pelo Covid-19 ou vacinação, já existem relatos de reinfecção pelo SARS-Cov-2 e contaminação de vacinados.
A Sociedade Brasileira de Imunização em nota de 26/03/2021 se posicionou, em resumo:
“A complexidade que envolve a proteção contra a doença torna desaconselhável a dosagem de anticorpos neutralizantes com o intuito de se estabelecer um correlato de proteção clínica, pois certamente não se avalia a proteção desenvolvida após vacinação apenas por testes laboratoriais “in vitro” através da dosagem de anticorpos neutralizantes.”
Assim como a Associação Médica Brasileira em nota de 26/04/2021:
“Diante do exposto, até o momento, a determinação da viragem sorológica não é recomendada formalmente de forma rotineira para se avaliar a imunidade (natural ou após a vacina) contra a infecção pelo SARS-Cov-2. Além disso, pessoas vacinadas, ainda que recente, não estão isentas das medidas protetivas preconizadas, mantendo-se a recomendação do uso de máscaras, higienização frequente e adequada das mãos e a prática do distanciamento social”
No momento, ainda aguardamos informações de estudos clínicos com informações mais detalhadas sobre o papel da avaliação laboratorial da imunidade frente a vacinação.
O médico do trabalho, neste momento, ainda deve reforçar os pilares preventivos em relação ao covid-19 como uma das principais ações no gerenciamento da saúde dos empregados. A vacinação irá auxiliar de forma importante o controle da transmissão do coronavírus conforme a sua cobertura for aumentando na população. No entanto, a vigilância em relação a novas cepas do vírus representar um fator de preocupação e atenção.
(Os artigos publicados refletem a opinião do autor).
Dr. Flávio Tocci. Médico do Trabalho. Diretor Científico da APMT.
Referências:
Sociedade Brasileira de Imunizações. Nota Técnica SBIm 26/03/2021 SBIm não recomenda a realização de sorologia para avaliar resposta imunológica às vacinas COVID-19.
Associação Médica Brasileira. CEM_COVID – AMB. Realização de sorologia para avaliar a resposta imunológica às vacinas Covid-19. 26/03/2021.
Sekine, T. et al. Robust T cell immunity in convalescent individuals with asymptomatic or mild COVID-19. Cell, VOLUME 183, ISSUE 1, P158-168.E14, OCTOBER 01, 2020.
https://media.tghn.org/medialibary/2021/02/20201228_Workshop_presentation_Materials_FINAL.pdf
Khoury D.S et al. What level of neutralising antibody protects from COVID-19? Posted March 11, 2021. doi: https://doi.org/10.1101/2021.03.09.21252641
Earle K.A et al. Evidence for antibody as a protective correlate for COVID-19 vaccines. Posted March 20, 2021. doi: https://doi.org/10.1101/2021.03.17.20200246
Ejazi SA et al. Antibody detection assays for COVID-19 diagnosis: an early overview. Immunol Cell Biol. 2021; 99(1): 21-33 doi: 10.1111/imcb.12397.