No trabalho, além dos cuidados na prevenção com os acidentes pessoais, precisamos voltar nossa atenção também para os acidentes coletivos como explosões de caldeiras, vazamento de gás, incêndio etc. O mais recente deles, e que provocou grande comoção mundial foi o acidente aéreo com o time da Chapecoense.
Não foi apenas um acidente de uma empresa, mas de várias empresas. Ali, foram envolvidos o clube da Chapecoense, as emissoras de TV Fox e SporTV e a companhia aérea LaMia. Enfim, jogadores, comissão técnica, jornalistas, cinegrafistas, radialistas, tripulação. Foram 71 mortes nesta que é considerada a maior tragédia da história com uma delegação esportiva e a maior do jornalismo brasileiro.
Para discutir o assunto, esta edição traz a opinião da Dra. Flávia Souza e Silva de Almeida, vice coordenadora do curso de Pós-graduação em Medicina do Trabalho da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Afinal, Dra. Flavia, a senhora considera acidente de trabalho o que aconteceu com o avião da LaMia/Chapecoense?
Sim, podemos considerar o caso do Chapecoense como um acidente de trabalho típico, pois eles estavam a serviço da empresa. Não se tratava necessariamente do trajeto do local de trabalho (que poderia ser considerado o clube), até a residência. Independentemente do tipo de acidente, todo acidente de trabalho fatal – como ocorreu com o da LaMia, deve ser notificado pelo SINAN de acordo com a portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016, que define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional. Caso sejam trabalhadores empregados também deve ser emitida a comunicação de acidente de trabalho – CAT. Isto está previsto pela lei Nº 8.213 de 24 de julho de 1991 no seu artigo 21 que diz: que equiparam-se também ao acidente do trabalho: o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho em viagem a serviço da empresa, independentemente do meio de locomoção utilizado.
Doutora, a senhora defendeu tese com este tema no seu mestrado?
Exatamente. Vou me ater nos achados referentes a acidente de trabalho fatal da dissertação defendida em setembro de 2011, denominada “Tendências na incidência e mortalidade por acidentes de trabalho no Brasil, 1998 a 2008”. Para a mortalidade por acidentes de trabalho no Brasil, registrou-se tendência de decréscimo, tanto na taxa, quanto no número de óbitos do ano de 1998 a 2008. A variação percentual anual nas taxas de mortalidade por acidente de trabalho no Brasil foi de -8,28% no período de 1998 a 2008. Outros países apresentaram declínio menor, tais como: Itália (-3,4% ao ano; 1951-1998), Espanha (-4,3% ao ano; 1992-2002), Coreia do Sul (-5% ao ano; 1998-2001) e Estados Unidos (-2% ao ano; 1998-2001). O menor declínio nesses países deve-se, possivelmente, ao fato de já terem menores taxas de mortalidade por acidente de trabalho, ou seja, encontram-se praticamente já estabilizadas.
Por qual motivo houve essa redução nas taxas de mortalidade?
Um dos principais motivos relacionado à redução na mortalidade pode ser explicada pela mudança da economia, que transferiu a mão de obra do setor secundário para o setor terciário, o que pode ter levado a uma menor exposição aos riscos ocupacionais e, consequentemente, a um menor número de óbitos. Além disso, não podemos deixar de pensar que houve um maior investimento em segurança e saúde do trabalhador, mas existem poucos estudos que avaliam os programas de saúde ocupacional.
Qual a saída, na sua opinião, para melhorar ainda mais esse quadro além do que vem sendo feito?
Há necessidade do aprimoramento de políticas públicas direcionadas à saúde do trabalhador, pois, apesar das taxas de incidência e mortalidade por acidentes de trabalho estarem em declínio, o número de casos ainda é elevado. É preciso, também, reafirmar a importância do aperfeiçoamento do registro de acidentes de trabalho, independentemente da forma do vínculo empregatício. Além de serem promovidas ações para a redução do número de casos, com investimentos em segurança e saúde dos trabalhadores tanto da parte dos órgãos governamentais, quanto das empresas e associações que agregam profissionais da área.
Prof.ª Dra. Flávia Souza e Silva de Almeida é médica do trabalho e vice coordenadora do curso de Pós-graduação em Medicina do Trabalho. Defendeu dissertação de mestrado sobre acidentes de trabalho. Link http://www.scielo.br/pdf/csp/v30n9/0102-311X-csp-30-9-1957.pdf