A simples mensuração da pressão arterial (PA) em consulta de rotina não deve ser analisada como diagnostico definitivo de hipertensão arterial, pois questões como síndrome do avental branco, mensuração sem repouso prévio, mensuração com técnica não adequada podem levar a decisões que impactam em restrições que com uma análise mais criteriosa talvez não fossem necessárias. Estratificar o risco cardiovascular através de scores já existentes parece ser o método que mais minimiza a possibilidade de erro e que orientara as medidas terapêuticas mais adequadas com relação a metas de controle laboratorial, de estilo de vida e de restrições no ambiente de trabalho.
Está amplamente estabelecida a relação causal, linear e contínua entre o aumento da pressão arterial (PA) e o risco de doença cardiovascular (DCV) em ambos os sexos, todas as idades e todos os grupos étnicos. A PA atua de forma sinérgica com outros fatores de risco (FR) para DCV e seu efeito pró-aterogênico será tanto maior quanto maior o for o número e a intensidade desses fatores adicionais. A DCV é uma condição multifatorial que depende de interações sinérgicas em todo o complexo causal responsável por seu desenvolvimento.
O aumento modesto de vários FR pode desencadear maior incremento no risco cardiovascular (CV) que a elevação acentuada de apenas um único FR. Assim, quantificar o risco do paciente hipertenso, ou seja, a probabilidade de determinado indivíduo desenvolver DCV em um determinado período de tempo é parte essencial do processo e pode nortear estratégias preventivas e de tratamento. A avaliação clínica do paciente hipertenso deve ser realizada seguindo o método tradicional, constituído por anamnese, exame físico e laboratorial. O seguimento de todas as etapas permitirá o diagnóstico correto da hipertensão arterial (HA), a estratificação do risco cardiovascular e renal, contribuindo para estabelecer a estratégia terapêutica mais adequada .
A anamnese deve ser realizada com história clínica completa, perguntas obrigatórias sobre o tempo de diagnóstico e tratamentos anti-hipertensivos instituídos previamente (medicamentos e doses) devem ser realizadas. Além disso, convém apurar os sintomas que indiquem a evolução da doença hipertensiva, especialmente a presença de lesão de órgãos-alvo (LOA). São importantes os antecedentes pessoais e a história familiar também deve ser obtida para corroborar o diagnóstico de HA primária. Durante a consulta, devem ser questionadas a existência de fatores de risco específicos para doença cardiovascular (DCV) e renal, comorbidades e aspectos biopsicossociais, culturais e socioeconômicos. É fundamental avaliar o uso de outros medicamentos, fármacos e drogas lícitas e ilícitas, que não anti-hipertensivos, que possam interferir na PA, bem como pesquisar indícios na história clínica que sugiram causas secundárias de HA.
Um exame físico minucioso deve ser realizado, com medida correta e repetida da PA (obter medidas repetitivas e acuradas em ambos os braços valendo a maior mensuração), além de se procurar sinais de LOA e achados que possam sugerir causas secundárias de HA. Os dados antropométricos, peso e altura, assim como o cálculo do índice de massa corporal (IMC) e da circunferência abdominal (CA), devem ser realizados. Realizar palpação e ausculta cardíaca e de carótidas, além de verificação dos pulsos. A medida do índice tornozelo braquial (ITB) também é incentivada, assim como a fundoscopia. Realiza-se o cálculo do ITB por meio da razão entre a pressão arterial sistólica (PAS) do braço e a do tornozelo, tanto esquerdo quanto direito. A relação PAS braço/PAS tornozelo normal é acima de 0,90. A obstrução leve caracteriza-se por ITB entre 0,71-0,90; moderada 0,41-0,70; e grave 0,00-0,40. Esta avaliação é importante tanto para o diagnóstico de doença arterial obstrutiva periférica quanto para o prognóstico de eventos cardiovasculares.
A avaliação laboratorial básica deve fazer parte da rotina inicial de todo paciente hipertenso. São recomendados as dosagens sérica de sódio, potássio, ácido úrico, creatinina, glicemia e perfil lipídico; realização de um exame sumário de urina com microalbuminuria em amostra isolada e de eletrocardiograma, para possível detecção de hipertrofia ventricular esquerda. Para a avaliação da função renal, devemos obter o ritmo de filtração glomerular estimado calculado por fórmulas, preferencialmente, pelo Chronic Kidney Diseases Epidemiology Collaboration (CKD-EPI) que podem ser obtidas no site http://mdrd.com/.
Classificação da pressão arterial de acordo com a medida em consultório a partir de 18 anos de idade .
PA ótima < 120 < 80
PA normal 120 – 129 80 – 84
Pre hipertensão 130 – 139 85 – 89
HA Estagio 1 140 – 159 90 – 99
HA Estagio 160 – 179 100 – 109
HA Estagio 3 > ou igual 180 > ou igual 110
Para a estratificação do risco CV global, deverá ser levado em conta, além dos fatores de risco clássicos, os novos fatores de risco que vêm sendo identificados, embora nem todos ainda tenham sido incorporados em escores clínicos. Nesta investigação, destacam-se alterações da glicemia ou da hemoglobina glicada, a obesidade abdominal (síndrome metabólica), a pressão de pulso > 65 mmHg em idosos, a história de pré-eclâmpsia/eclâmpsia e a história familiar de HA (em hipertensos limítrofes).
Atenção a outros fatores de risco cardiovascular adicionais tais como: Idade (mulher > 65 anos e homem > 55 anos), tabagismo, dislipidemia: triglicerídeos (TG) > 150 mg/dL em jejum; LDL-c > 100 mg/dL; HDL-c < 40 mg/dL, diabetes melito (DM) já confirmado (glicemia de jejum de, pelo menos, 8 horas ≥ 126 mg/dL, glicemia aleatória ≥ 200 mg/dL ou HbA1c ≥ 6,5%) ou pré-diabetes (glicemia de jejum entre 100 e 125 mg/dL ou HbA1c entre 5,7 e 6,4%), História familiar prematura de DCV: em mulher < 65 anos e homem < 55 anos Pressão de pulso em idosos (PP = PAS – PAD) > 65 mmHg ITB ou VOP anormais, história patológica pregressa de pré-eclâmpsia ou eclampsia, obesidade central: IMC < 24,9 Kg/m2 (normal); entre 25 e 29,9 Kg/m2 (sobrepeso); > 30 Kg/m2 (obesidade), relação cintura/quadril (C/Q) cintura abdominal = mulher < 88 cm e homem < 102 cm Cintura: C = no ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca lateral Quadril Q = ao nível do trocanter maior Cálculo (C/Q) = mulher: C/Q 0,85; homens: C/Q 0,95 Perfil de síndrome metabólica C: cintura, Q: quadril, C/Q: relação cintura quadril, ITB: índice tornozelo braquial, PP: pressão de pulso, IMC: índice de massa corpórea. O LDLc é calculado pela seguinte fórmula: LDLc = colesterol total – (HDLc + triglicerídeos/5) (quando a dosagem de triglicerídeos for abaixo de 400 mg/dL). O LDLc também tem sido dosado por alguns laboratórios, fazendo parte da rotina laboratorial.
Neste contexto, ressalta-se a importância da classificação do risco CV que dependera dos níveis da PA, dos FRCV associados, da presença de lesões em órgãos-alvo (LOA), que são lesões estruturais e/ou funcionais decorrentes da HA em vasos, coração, cérebro, rins e retina, e/ou da existência de DCV ou doença renal estabelecida. Diferentes escores foram desenvolvidos e vêm sendo aplicados para classificar os pacientes hipertensos em categorias de baixo, moderado e alto risco, entretanto novos biomarcadores, precursores e preditores de doença parecem ainda ser necessários para melhorar a predição de risco e reduzir a diferença entre o risco calculado e as taxas de eventos observadas, sobretudo nos indivíduos estratificados como de risco moderado. Neste sentido destacam-se o BNP, o score de cálcio coronariano a velocidade da onda de pulso VOP (marcador da rigidez arterial) e as alterações nas provas de atividades inflamatórias como a PCR ultra sensível e alterações na sensibilidade a insulina. Atualmente o método mais empregado para avaliar a função endotelial in vivo e a dilatação fluxo medida (DFM) ainda restrita ao campo da pesquisa.
Dr Luiz Afonso Pressutti CRM 85 101 SP . Formado em medicina pela universidade de Santo Amaro , especialista em Clinica Medica e Terapia intensiva ( Amib) . Médico consultor clínico da Bmpc.